A ideia surgiu, em 2015, durante o trabalho de conclusão de curso para a faculdade de administração, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Luis Borba aceitou o desafio do professor Leandro Zanardi e foi atrás de uma solução para combater o desperdício de alimentos. Estudou o varejo e ficou perplexo com o que descobriu.
De 2% a 6% do faturamento do setor no Brasil são perdidos, todos os anos, com o descarte de produtos prestes a expirar, mas em perfeitas condições de consumo. Apenas entre os supermercados, os prejuízos chegam a R$ 8 bilhões — um contrassenso em um país com 64 milhões pessoas em insegurança alimentar. Borba encontrara seu foco de atuação
Assim, cinco anos depois, ele e Zanardi, agora sócio do antigo aluno, fundaram a SuperOpa, espécie de outlet de alimentos, com até 70% de desconto.
Mas, operando no B2C (business-to-consumer), em uma plataforma aberta na internet, o modelo de negócios começou a criar atrito com as empresas parceiras.
“Nós vendíamos tanto na Faria Lima quanto em Paraisópolis”, conta o CEO Borba, em entrevista ao NeoFeed. Com isso, marcas de alto giro, de gigantes como Nestlé, Unilever e Mondelez, eram canibalizadas no aplicativo da startup.
Pelo fim dos conflitos e determinados a fazer a comida chegar a quem, de fato, tem fome, a dupla lançou, em 2023, a FoodPass, braço de benefícios corporativos da SuperOpa.
Se antes Borba e Zanardi disputavam espaço com outras startups, como a Food To Save, a b4waste e a Diferente, com a FoodPass, passaram a navegar sozinhos, em águas ainda inexploradas.
A menina Maria
Inédita no Brasil, a tecnologia desenvolvida pela dupla permite às empresas clientes disponibilizar o valor que seria gasto com cestas básicas em compras no novo app.
Com isso, os trabalhadores podem todos os meses personalizar os produtos de acordo com as necessidades e gostos da família. E essa é a grande sacada da FoodPass. Tem mais.
“Se o valor da compra, por acaso, ultrapassar o limite estabelecido pelo empregador, o colaborador tem a opção de pagar a diferença ou descontar do benefício do mês seguinte”, explica o CEO.
Ao funcionar no B2B (business-to-business), em um ecossistema fechado, a FoodPass consegue manter os descontos agressivos que, na SuperOpa, incomodavam as companhias parceiras — hoje, elas são 60.
Para se ter ideia do abatimento de preços, uma cesta básica equivalente a R$ 150, no app, pode virar R$ 225, permitindo ao trabalhador levar 50% a mais de comida para casa.
Atualmente, cerca de 30 mil pessoas têm acesso à plataforma. São trabalhadores de 700 companhias, entre metalúrgicas, empresas de ônibus e redes de hospital. Mulheres e homens cujos rendimentos mensais somam, em média, três salários mínimos.
Sim, nem todos os brasileiros em insegurança alimentar estão desempregados ou vivem da economia informal. O CEO não esquece a menina Maria.
Lá atrás, entre 2017 e 2018, enquanto ainda estudava o mercado para a criação da SuperOpa, ele conheceu a garotinha em uma creche mantida por uma ONG, no centro da capital paulista.
Aos seis anos, ela explicou a Borba o porquê de estar inscrita na instituição, enquanto os pais trabalhavam em fábricas próximas. Lá, conseguia tomar café-da-manhã e almoçar, o que em casa, normalmente, era impossível.
“Mesmo com os adultos empregados, a família enfrentava dificuldades com a alimentação”, lembra Borba.
A alavancagem do negócio
Com a nova estratégia de negócios, a logística é mais simples e, portanto, menos dispendiosa. Diferente das entregas porta a porta, de cada usuário da SuperOpa, as da FoddPass saem do galpão de 3,5 mil metros quadrados, na Grande São Paulo, com destino apenas ao endereço das empresas responsáveis pelo fornecimento da cesta.
Graças à plataforma, a SuperOpa atingiu o breakeven no último trimestre de 2023. Atualmente, o aplicativo responde por 70% da receita da startup. O faturamento de R$ 3 milhões, em 2022, saltou para R$ 11,3 milhões, no ano passado. E a expectativa é fechar 2024 com o triplo desse valor.
Já tendo levantado R$ 8,2 milhões, com empresas de venture capital como a SMU Investimentos, Bossa Nova Investimentos, Google for Startups, Harvard Angels e RG Futures, Borba e Zanardi pretendem abrir uma nova rodada de investimentos em 2025. Esperam captar entre R$ 3o milhões e R$ 35 milhões.
Com o negócio mais maduro, a dupla de sócios planeja levar a FoodPass para além de São Paulo. A próxima parada deve ser em Minas Gerais ou no Rio de Janeiro.
Mercado de R$ 50 bi
No Brasil, a concessão de benefícios em produtos alimentícios é regulada pelo PAT. Criado em 1976, o Programa de Alimentação do Trabalhador opera sob dois modelos.
O chamado facilitador é aquele fornecido sob a forma de cartões, usados em supermercados e restaurantes, por exemplo — onde, segundo Borba, prevalece uma “briga de foice gigantesca”.
O segundo sistema é o fornecedor, no qual o funcionário recebe a cesta básica física. Com grande parte dos beneficiários no grupo dos trabalhadores de baixa renda, o setor movimenta anualmente R$ 50 bilhões, informa o empresário.
No último levantamento do Ministério do Trabalho e Emprego, realizado março de 2024, há cerca de 18,5 mil empresas cadastradas no PAT. Ou seja, há ainda muito espaço para a FoddPass crescer. Por enquanto, ela circula sozinha nesse imenso oceano azul, repleto de oportunidades.