Questão veio a tona com chegada do papa Francisco; cúpula do G7 na Apúlia começou com um precedente importante: a declaração da edição anterior, em Hiroshima, em cujo texto final menciona a defesa do aborto
Os líderes do G7, as sete democracias mais industrializadas do planeta, mostraram posições divergentes sobre a inclusão do direito ao aborto na declaração final da sua cúpula na região da Apúlia, no sul da Itália, e por enquanto optaram por limitar-se a defender os “direitos reprodutivos”. Até o momento, o rascunho divulgado por diversos meios de comunicação não inclui a palavra “aborto”. O embate foi protagonizado pela primeira-ministra anfitriã, a direitista Giorgia Meloni, e pelo presidente francês, o liberal Emmanuel Macron, com declarações cruzadas e pontos de vista opostos sobre a matéria. A questão explodiu precisamente no dia da chegada do papa Francisco, na primeira vez em que um pontífice participa do G7. A cúpula do G7 na Apúlia começou com um precedente importante, a declaração da edição anterior, em Hiroshima, em cujo texto final os líderes de Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido assinaram a defesa do aborto, deixando a palavra escrita, com todas as letras. “Reafirmamos o nosso total compromisso em alcançar uma saúde e direitos sexuais e reprodutivos abrangentes para todos, abordando também o acesso ao aborto legal e seguro e aos cuidados pós-aborto”, afirma o texto acordado no Japão. No entanto, a cúpula deste ano na Itália, país governado desde outubro de 2022 pela direita, abriu o debate sobre a manutenção ou não desta referência.
Até o momento, segundo fontes negociadoras, a palavra “aborto” não aparece na declaração de Apúlia, que será concluída e anunciada esta tarde, e a alternativa é “garantir os direitos sexuais e reprodutivos”. Os negociadores da União Europeia (UE), presentes na cúpula do G7, têm defendido o que foi conseguido em Hiroshima como “mais específico”, mas temem que “não seja possível chegar a um acordo”. Um funcionário de alto escalão dos EUA observou que o G7 apoiará uma linguagem na sua declaração final semelhante à da última cúpula sobre a defesa dos direitos reprodutivos, mas não chegou a dizer se a menção ao acesso a um “aborto seguro e legal” da conferência do ano passado aparecerá novamente. O presidente dos EUA, Joe Biden, presente na cúpula, fez do direito ao aborto uma questão central da sua campanha eleitoral de novembro em busca de eleitores independentes e especialmente de mulheres de classe média, que se sentem indignadas depois que, em junho de 2022, o Supremo Tribunal americano, dominado por juízes conservadores, anulou a decisão conhecida como “Roe vs. Wade”.
Ao revogar essa decisão que durante meio século protegeu os direitos reprodutivos das mulheres em nível federal, os estados tiveram liberdade para legislar sobre o assunto, de modo que atualmente 22 dos 50 estados dos EUA restringem ou proíbem completamente esse procedimento. A questão esteve presente no primeiro dia da cúpula, no qual, depois de anunciar que o G7 tinha chegado a um importante acordo político para ajudar a Ucrânia com um empréstimo financiado com lucros dos ativos russos, Macron e Meloni se confrontaram à distância no final da jornada. Questionado pelos jornalistas, Macron lamentou que a palavra tenha desaparecido, destacando “diferentes sensibilidades” sobre a questão, depois de França ter incluído o direito ao aborto na Constituição.
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As declarações do líder francês incomodaram muito Meloni, que o acusou de fazer “campanha eleitoral” no lugar errado. “Não há razão para discutir questões sobre as quais concordamos há muito tempo. E penso que é profundamente errado, em tempos difíceis como estes, fazer campanha usando um fórum tão valioso como o G7”, argumentou. Meloni insistiu que a polêmica “é totalmente falsa” e que a declaração “faz lembrar a de Hiroshima, na qual já aprovamos no ano passado a necessidade de garantir que o aborto seja ‘seguro e legal’”, justificou. A frieza entre os dois líderes ficou evidente na chegada ao jantar de gala oferecido pelo presidente italiano, Sergio Mattarella, a quem Macron abraçou carinhosamente na chegada antes de cumprimentar uma desconfortável Meloni.
*Com informações de EFE
Publicado por Heverton Nascimento